Sete em cada dez micro e pequenas empresas que abrem as portas
no país conseguem sobreviver aos dois primeiros anos de atividade.
Antes de 2005, metade dos novos negócios abertos não conseguia sobreviver a esse período de dois anos.
O aumento da escolaridade dos empreendedores, a diminuição da carga
tributária, as mudanças na legislação e o crescimento da economia nos
últimos anos são alguns dos principais responsáveis pela melhora do
indicador.
As informações foram compiladas pelo Sebrae nacional a partir de
registros da Receita Federal em quase 1 milhão de empresas abertas em
2005/ 2006 e monitoradas por quatro anos.
A taxa de sobrevivência das micro e pequenas empresas do Brasil supera a
da Itália e está próxima da do Canadá. O que permitiu ao país chegar a
esse patamar é o fato de empreendedores estarem mais profissionalizados e
buscarem se capacitar, diz Jairo Martins, superintendente da FNQ
(Fundação Nacional da Qualidade), entidade privada criada por
representantes de 39 organizações dos setores público e privado.
É o caso de Raquel Cruz, que, em 2001, deixou o cargo de
secretária-executiva, exercido por 15 anos em multinacionais, para
montar a Feitiços Aromáticos.
Depois de criar aromas com ajuda de uma empresa terceirizada e
distribuir colônias no porta-malas do carro, voltou a estudar, formou-se
técnica em química e fez pós-graduação em cosmetologia para melhorar a
qualidade dos produtos que fabricava.
"Enquanto esperava registros e cumpria exigências da Anvisa, fui
estudar. Não só química. Aprendi também a controlar caixa, estoque e até
qualidade e inovação", diz.
Os R$ 40 mil investidos para montar a empresa se transformaram em uma
indústria na zona leste, com 20 funcionários, faturamento anual de R$
3,5 milhões, clientes em 3.000 pontos de venda do país, além de em
Portugal, na Espanha e no Chile.
"O empresário montava seu negócio sem olhar para os clientes nem para o
mercado. E o resultado não podia ser outro: 'quebrava a cara'. Agora,
planejamento e gestão fazem parte do vocabulário", diz Martins.
Com a melhora na renda, 40 milhões de brasileiros passaram a consumir e a
demandar mais serviços e produtos, diz Luiz Barretto, presidente do
Sebrae. "Para atendê-los, os empreendedores foram ao mercado em busca de
oportunidade, e não por necessidade", diz Barretto.
Bancos criam produtos e serviços para facilitar gestão
Juliana Elias - Colaboração para a Folha
De olho num setor que cresce rapidamente, bancos estão criando produtos e
serviços específicos para micro, pequenas e médias empresas.
O objetivo é ir além de linhas de financiamento e crédito e passar a dar
atendimento especial, consultoria de negócios, ferramentas para
acompanhar a gestão e plataformas de venda digital, entre outros (veja
quadro).
"Há dez anos, tínhamos um cenário completamente diferente", diz o
gerente de mercado e serviços financeiros do Sebrae (Serviço Brasileiro
de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), Paulo Alvim. "De um lado, as
empresas reclamavam da falta de linhas de crédito, e, de outro, os
bancos se queixavam da falta de estrutura das pequenas empresas."
Os problemas passavam pelo alto índice de informalidade e insegurança
dessas empresas, pela falta de caixa e pela dificuldade em fornecer
garantias na tomada de um empréstimo.
Clientes em ascensão
Muito dessa natureza ainda permanece, mas a relação entre os dois lados
evoluiu. Os bancos que abriram mais espaço ao nicho se beneficiam do
fato de as empresas menores ganharem com o mercado interno, enquanto as
grandes, mais suscetíveis ao mercado externo, bambeiam com a crise
internacional.
No Banco do Brasil, por exemplo, são as micro e pequenas que vêm puxando
o crescimento da carteira de crédito --até o primeiro trimestre, subiu
24,3% em 12 meses, o dobro dos 12,6% das médias e grandes e dos 13% dos
clientes pessoa física.
No Bradesco, que divulgou na semana passada os resultados do segundo
trimestre, o movimento é semelhante. A previsão do banco é que o
segmento, que vem estabilizando os índices de inadimplência, cresça até
20% neste ano na carteira de crédito.
É uma expansão maior que os 17% das grandes empresas, fatia em que a
falta de pontualidade dos pagamentos, por outro lado, subiu.
Os micro e pequenos precisam de mais atenção e orientação financeira,
avalia Dário Castro de Araújo, superintendente nacional de MPEs da Caixa
Econômica Federal. Essas empresas representam 85% dos clientes
jurídicos do banco e responderam por um aumento de 50% na tomada de
crédito entre o 2011 e 2012, considerando o primeiro semestre.
"Diferentemente das empresas de grande porte, que apresentam uma forte
governança corporativa, as micro e pequenas se preocupam menos e têm
menos recursos para isso", diz.
Instituições públicas, como a Caixa, o BB e os regionais Banco do
Nordeste e o Banco da Amazônia, saem na frente com as melhores condições
de preços e juros, muitas vezes subsidiados.
Por outro lado, ressalta Alvim, do Sebrae, os bancos privados vêm sendo
forçados a correr atrás da concorrência e ganham em agilidade e menos
burocracia.
"O mercado está aquecido e a concorrência é forte, o que deixa as
condições favoráveis para o cliente", diz Alvim. "O que o pequeno
empresário tem de fazer é pesquisar bem todas as opções, antes de
contratar qualquer coisa, e usar o poder de barganha que a concorrência
aquecida proporciona."
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Editoria de Arte/Folhapress |
Segredo é ser diferente e ter foco, sugere quem prosperou
Claudia Rolli - de São Paulo
Aos dez anos de idade, Nathaniel José Vieira Pereira viu o pai perder a
mercearia que tinha na cidade de Ipatinga, interior de Minas, por não
saber administrar o negócio.
O impacto da falência ficou guardado como lição. "Saí determinado a
estudar para que aquilo não voltasse a acontecer", diz ele, hoje aos 38.
Anos mais tarde, em 1989, tornou-se sócio de um escritório após terminar o curso de ciências contábeis.
Em uma sala de 30 metros quadrados montada no fundo do quintal de uma
casa, com cadeiras, estantes e mesas cedidas por amigos, nascia a NTW
Contabilidade e Gestão Empresarial, em parceria com um amigo.
Hoje são seis unidades --três filiais próprias e três franquias-- e 700
candidatos a abrir um escritório da marca em todo o país, além de
propostas na Argentina, em Portugal e em Moçambique.
"Desde pequenos, pensávamos e agíamos como uma grande empresa, com
profissionalismo. Não há fórmula nem mágica para dar certo: tem de ter
foco."
Ao montar o negócio, a primeira decisão foi oferecer serviços contábeis e
de gestão para escolas e universidades --o pacote incluía desde
informações sobre legislação tributária e compromissos fiscais até
indicadores que permitissem melhorar o negócio.
"Para as universidades, criamos uma maneira de avaliar e acompanhar os
resultados dos cursos. Um método que permite, com base no número de
inscritos no vestibular, projetar a lucratividade do curso até a
formatura de cada turma", diz.
São 70 funcionários para atender 700 clientes, entre eles quatro
universidades mineiras --a empresa criou uma divisão para atender
exclusivamente o setor de educação.
"Resolvi entender como o mercado tratava a informação contábil e me
colocava no lugar de quem precisava da informação. Resolvi trabalhar sob
medida, como um 'alfaite' fiscal."
A partir da experiência com educação, a empresa começou a desenvolver
serviços para o segmento de saúde, postos de combustíveis e construção
civil, entre outros.
"Atendo desde microempresas até a Petrobras."
Com alguns prêmios no currículo, a empresa assessora agora companhias
chinesas que pretendem investir no Brasil. "Participamos da maior feira
de negócios na China e os empresários de lá nos contrataram para
entender a complexa legislação do país. O que é burocracia para eles é
negócio para a NTW", diz o empresário.
Assim como Pereira, um terço dos cerca de 2.000 empresários
entrevistados em uma pesquisa do Sebrae-SP decidiu abrir uma empresa por
identificar uma oportunidade no mercado.
E, entre as que se mantêm no mercado, 43% recomendam oferecer produtos e
serviços diferenciados como a forma de atrair mais clientes e
prosperar.
Alex Furtado, dono da agência de viagens Ar Bonito, em Mato Grosso do
Sul, segue a receita há nove anos. Mantém a empresa aberta 24 horas para
atender os clientes. "Agências são muitas. Mas para poucas você pode
ligar às 3h e pedir para montar um pacote."
Depois de velejar pelo mundo por dez anos e trabalhar como free-lancer, decidiu montar a Ar Bonito.
Das reuniões semanais com os funcionários surgem novas ideias, metas e
planejamento. "Temos uma fábrica de ideias, uma ferramenta que permite a
todos responder a 20 perguntas sobre a empresa e como conduziriam o
negócio. As sugestões se transformam em ações", diz.
Fora a matriz, já tem duas filiais, em João Pessoa e São Paulo, além de
trabalhar com o que chama de "agentes remotos" em seis capitais. "Laura,
a primeira vendedora que me acompanha na agência, trabalha de pijama em
casa, em Mogi-Mirim. Ela teve de mudar fisicamente, mas continua
comigo."
São 82 funcionários diretos e 400 indiretos --profissionais que prestam
serviço a clientes. "Comecei com R$ 50 mil. Hoje administramos dois
hotéis, dois restaurantes e temos um faturamento médio de R$ 7 milhões
por ano."
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País vive 'apagão' de gestão empresarial
Claudia Rolli - de São Paulo
Sem conhecer a concorrência e o mercado em que pretende atuar, não há
como atrair clientes. Sem atrair clientes, não há como ter capital para
manter as portas abertas.
O que parece óbvio ainda é o principal motivo que leva as empresas a
fechar as portas: falta de planejamento financeiro e estratégico.
"Assim como se fala em apagão de mão de obra, no país há também o apagão
de gestão empresarial. A competição é acirrada, as mudanças
tecnológicas, constantes. Não há como se manter no mercado se você não
entende o seu negócio", diz Luiz Barretto, presidente do Sebrae.
Marcelo Nakagawa, coordenador do centro de empreendedorismo do Insper
(Instituto de Ensino e Pesquisa), concorda. "Tem de colocar no papel os
custos, os equipamentos necessários, seguir um plano de negócios,
elencar clientes, conhecer concorrentes, fornecedores, a estrutura de
produção, de custos. Muita gente pensa que é investir e pronto", diz o
professor. "Uma pessoa leva até os 20 e poucos anos para conseguir
aprender a se sustentar financeiramente e pagar suas contas. Com uma
empresa, não é diferente. Tem um tempo para isso."
Amigos x Negócios
Entre os motivos que levam as empresas a fechar as portas também está o conflito entre os sócios.
"Há momentos de paz e de guerra. O mais indicado é fazer um contrato,
mesmo que seja de gaveta, esclarecendo as responsabilidades e as
obrigações de cada um", afirma o professor.
Enquanto os sócios ficam brigando para ver quem tem a maior
participação, a empresa não tem dinheiro nem para pagar as contas, diz
Nakagawa.
Empresa x Empresário
Além de separar as funções de cada sócio, a recomendação é para que os
empreendedores separem o patrimônio da empresa do pessoal.
Seis em cada dez empresas que fecham as portas perdem recursos e parte dos empreendedores não consegue recuperar o investimento.
Em São Paulo, dados divulgados em agosto de 2010 pelo Sebrae-SP mostram que a perda em média era de R$ 26,4 mil.
A maioria dos empreendedores que encerram seu negócio volta ao mercado como empregado com carteira assinada.
Fonte: Folha de S.Paulo / por Fenacon
Escrito por: Claudia Rolli